Crise hídrica pode aumentar inflação nos estados brasileiros

Supermercado na zona sul do Rio de Janeiro.
Supermercado na zona sul do Rio de Janeiro.

Parlamentares apontam que grave desabastecimento hídrico em alguns estados pode impactar na inflação e ocasionar a desaceleração da retomada da economia

DA REDAÇÃO

O Brasil vive a pior crise hídrica dos últimos 91 anos, segundo dados de afluência do Sistema Interligado Nacional (SIN) para o período dos últimos meses de setembro a março. Os institutos de meteorologia já estavam alertando que as chuvas do último período úmido, de novembro de 2020 a abril de 2021, seriam abaixo da média. 

A Agência Nacional de Águas (ANA) publicou, no dia 1º de junho, a Resolução n°77/2021, que declarava a Situação Crítica de Escassez Quantitativa de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica do Paraná, que ocupa 10% do território brasileiro, abrangendo São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Goiás, Santa Catarina e Distrito Federal. A situação crítica da região hidrográfica mais populosa e de maior desenvolvimento econômico do País aponta para um cenário de alerta nacional.

O mestre em Energia Solar Fotovoltaica e secretário-adjunto de Assuntos Técnicos do Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel), Tassio Barboza, explica que a escassez hídrica afeta vários segmentos de forma contínua, e ressalta a importância das águas para as proporções do território nacional.

“Segundo a Agência Nacional de Águas, o Brasil utiliza suas bacias hidrográficas principalmente para irrigação, abastecimento animal, industrial, urbano, entre outros, nessa ordem. A geração de energia elétrica e o transporte hidroviário precisam também de água — mas ela não é consumida com a utilização. O Brasil é um país continental e precisa disponibilizar os recursos hídricos para todos esses fins. Quando falta água no reservatório, toda essa cadeia é afetada.”

Ou seja, a crise hídrica está diretamente relacionada, por exemplo, com a energia elétrica, como levanta o especialista. “O sistema elétrico brasileiro, na última crise lá em 2001, tinha uma geração 90% advindo da força das águas. Agora, em 2020, esse percentual já caiu para 72% e a tendência é que caia ainda mais. Apesar de ser um valor muito alto, fica claro que o País já tem outras alternativas para gerar energia, ou seja, a gente pode gerar energia, por exemplo, das fontes térmicas”, lembra. 

Crise e caminhos

Mesmo com essa queda da dependência da força das águas para o cenário energético nacional, Tassio classifica que “o sistema elétrico do Brasil hoje se encontra na UTI”. “As usinas térmicas são o oxigênio que vai manter o sistema de pé. Sem as usinas térmicas, certamente, a gente já teria o mesmo problema que tivemos lá em 2001, as pessoas teriam que desligar a luz, diminuir a carga para que não houvesse um apagão.”

De acordo com o deputado Felício Laterça (PSL/RJ), medidas emergenciais precisam ser adotadas para gerir a atual crise hídrica. “É necessário que se tenha uma visão de longo prazo para evitar que novas crises se repitam, especialmente mediante a adoção de políticas públicas que reduzam as emissões de carbono pela queima de combustíveis fósseis como o carvão. Além disso, outras medidas como a maior diversificação da matriz energética nacional, especialmente baseada em fontes renováveis de energia, como a solar e a eólica, a dessalinização da água do mar, a transposição de rios, a água de reuso e, acima de tudo, a conscientização da população são medidas fundamentais para gerir a atual crise e evitar futuras”, pontua.

Tassio opina que a Câmara dos Deputados não está voltando os olhos para as possíveis crises hídricas no setor elétrico, e que soluções renováveis como a captação de energia solar nos telhados precisam ser debatidas. “O Brasil precisa de energia, faça chuva ou faça sol. Não podemos depender das chuvas. O brasileiro quer gerar a própria energia.”

Rio de Janeiro

Na perspectiva do deputado federal Felício Laterça (PSL/RJ), a crise hídrica traz consequências para todo o sistema nacional, não apenas do Rio de Janeiro. 

“A gestão do sistema elétrico no País é centralizada e o grave desabastecimento hídrico em alguns estados pode impactar na inflação e ocasionar a desaceleração da retomada da economia. Segurança hídrica deve ser a pauta de todos os níveis de governo como forma de prioridade estratégica de desenvolvimento. Se não forem adotadas ações de longo prazo, em breve serão impactados a produção de alimentos, a indústria e todos os demais outros múltiplos da água, o que gerará perdas econômicas importantes para todo o país.”

Novo Marco do Setor Elétrico 

Aprovado pelo Senado Federal, o PL aguarda despacho do presidente da Câmara dos Deputados. O texto, antigo PLS 232/2016, estabelece como mudança principal a portabilidade da conta de luz entre as distribuidoras, alterando o marco regulatório do setor elétrico para criar um mercado livre. A proposta ainda permite o compartilhamento, entre as distribuidoras, dos custos com a migração de consumidores para o mercado livre. Atualmente, elas são obrigadas a contratar toda a carga de energia elétrica para atender os consumidores.

Segundo Laterça, o Novo Marco Legal do Setor Elétrico (PL 414/2021) traz inovações importantes para o setor com a abertura do Mercado Livre e a separação de lastro e energia, que traz o fim do mecanismo da realocação de energia. “A administração da sobrecontratação involuntária, a racionalização de subsídios, a descotização e a privatização de concessionária de geração, todas essas medidas irão trazer o modelo mais competitivo para o setor elétrico, objetivando, principalmente, reforçar a segurança energética e a modicidade tarifária.

Com a aprovação da MP da Eletrobras, o texto deve sofrer ligeiros ajustes. O projeto ainda vem de encontro com outras medidas parlamentares de enfrentamento à crise atual, como o já aprovado PL 3975/2019, que trata do risco hidrológico, e da Medida Provisória 998/2020, que remaneja recursos no setor elétrico para permitir a redução de tarifas de energia.
 

Fonte: Brasil 61

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