Por meio da Agência, Governo de Goiás já instalou dois ensaios em propriedades onde foi identificada ocorrência de broca-do-tronco para elaboração de medidas paliativas e posterior definição de tratamento adequado. Estudos seguem avançando
DA REDAÇÃO
Em dezembro de 2014, a despreocupação dos finais de semana passados na chácara da família Holanda, em Abadia de Goiás, foi interrompida por uma manifestação atípica nos pequizeiros ali plantados. A matriarca Lucilene Nogueira dos Santos Holanda, também chamada de Lene, notou a ocorrência do que pensaria ser acúmulo de serragem causada por cupim ao pé das árvores. Somente no final do ano passado ela descobriria que, na verdade, se tratava da broca-do-tronco do pequizeiro, praga que pegou Goiás e Minas Gerais de surpresa e tem assustado os produtores com a morte rápida das árvores, até então aparentemente sadias.
A broca-do-tronco ataca o tronco e as raízes do pequizeiro, construindo galerias em seu interior, fazendo com que o fluxo da seiva seja obstruído e dificultando a absorção de nutrientes pela planta. O que Lene desconfiou ser serragem na base das árvores eram as fezes da lagarta, um dos sinais mais evidentes da ocorrência da broca, segundo a pesquisadora da Emater, Karin Collier, responsável por coordenar a investigação que vem sendo realizada pelo Governo de Goiás, por meio da Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (Emater), na Estação Experimental Nativas do Cerrado, em Goiânia. Ainda de acordo com ela, aberturas no tronco, provocadas pela passagem da larva, também são um indício.
Apesar da chácara da família Holanda não ser voltada para a produção rural, o local conta com 100 pés de pequi que são cultivados com muito cuidado. Por isso, Lene resolveu procurar a Emater, após assistir uma reportagem na qual a instituição orientava agricultores de todo o Estado a comunicar o órgão caso detectassem ataques incomuns aos pequizeiros.
A cientista Karin explica que essa união entre a comunidade e as entidades de pesquisa é fundamental para a evolução do trabalho, que consiste na identificação e análise dos mecanismos biológicos da lagarta para, assim, possivelmente encontrar formas de combate. “Os avanços só estão sendo possíveis graças à cooperação dos produtores e da sociedade de modo geral. A divulgação do problema tem levado o nome da Emater e com isso eles têm feito contato”, relata.
Em estágio de descrição biológica e compreensão comportamental da broca-do-tronco, a operação de investigação já conta com duas áreas de ensaio em propriedades atingidas pela praga. O intuito é definir medidas de controle paliativo, que ainda não são a solução definitiva para o evento. Segundo Karin, a metodologia não está completa, mas será importante para fornecer uma primeira resposta aos agricultores, coletadores de pequi e proprietários de espaços rurais onde houve registros do inseto. A previsão é que até o início de 2022 já se tenha estipulado o tratamento testado adequado.
Esperança na pesquisa
A agricultora familiar de Hidrolândia, Célia Maria Silva Santos, estava aflita depois de ver cair dois dos 80 pés de pequi de sua propriedade. Há cerca de sete anos a produtora rural começou a introduzir espécies frutíferas nativas do Cerrado para consumo próprio, já que a principal fonte de renda de sua família é obtida com a produção de leite. No entanto, a expectativa era comercializar o excedente dos frutos de pequi quando as árvores começassem a produzir, plano colocado em xeque por decorrência da broca-do-tronco.
Inicialmente, o problema também foi constatado por ela como ataque de cupins, o que a levou à utilização de inseticidas específicos para essa classe. A medida pareceu eficiente por algum tempo, mas depois a praga voltou a ser registrada no pequizal. “Fiquei sem saber o que fazer. Percebi que até as plantas mais jovens também estavam sendo atacadas”, conta Célia. “Sou apaixonada pelos meus pés de pequi. Fiquei tão contrariada achando que todos iam cair.”
Um lampejo de esperança chegou junto com a visita da equipe técnica da Emater liderada pela pesquisadora Karin. Os profissionais estão atuando em três eixos simultaneamente: o monitoramento, cujo propósito é mapear a ocorrência da praga em Goiás; o estudo do ciclo de vida do inseto, processo conduzido por meio de sua criação em laboratório; e a elaboração de alternativas para a recuperação dos pequizeiros atacados.
Histórico da praga
Os primeiros registros em quantidades significativas de broca-do-tronco aconteceram em 2019 em Janpovar, município da região Norte de Minas Gerais. Por causa da infestação, produtores mineiros relataram que houve redução da safra do pequi, que ocorre entre dezembro e fevereiro.
Quando o ataque foi identificado em Goiás, a Emater passou a integrar a força-tarefa para descobrir a espécie da lagarta ao lado da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Por meio da parceria, as entidades realizaram em junho último uma rodada de palestras para apresentarem informações inéditas sobre a broca, o Ciclo de Palestras sobre Fitossanidade do Pequizeiro.
Pela primeira vez, foram divulgadas imagens detalhadas da lagarta e informações sobre sua fase adulta, quando se torna uma mariposa. Para o pesquisador da Epamig, Antônio Cláudio, é importante que a espécie seja verificada para que se possa compreender o comportamento do animal. Já se sabe que a broca-do-tronco do pequizeiro faz parte da família Cossidae, da ordem Lepidóptera.
“A integração entre as instituições é muito importante para a troca de informações. Desta forma, podemos avançar com mais rapidez sobre os problemas fitossanitários do pequizeiro”, pontua Karin Collier. Goiás e Minas Gerais estão entre os três Estados com maior volume de produção de pequi do País. Na terceira posição, conforme a Radiografia do Agro, o Estado Goiano conta com 433 estabelecimentos e produção estimada em 2.017 toneladas.